Hiperaldosteronismo primário

De WikiPETia Medica

Texto de Viviane Teixeira


Hiperaldosteronismo Primário



O aldosteronismo, relacionado à hipersecreção da glândula supra-renal, pode ser do tipo primário, quando a produção excessiva e autônoma do hormônio reside na própria glândula e é independente da estimulação normal pelo sistema renina-angiotensina, ou do tipo secundário, se o estímulo for extra-supra-renal, ou seja, quando ocorrer um estímulo fisiológico à secreção de aldosterona pela glândula, como em casos de hipovolemia e ICC. Um terceiro tipo de hiperaldosteronismo pode ser considerado quando há estenose de artéria renal, por estímulo patológico à secreção de renina. O aldosteronismo primário quando associado a um adenoma supra-renal produtor de aldosterona, em especial proveniente de células da zona glomerulosa, é chamado de Síndrome de Conn, correspondendo a cerca de 65-70%. Cerca de 30% dos casos são decorrentes de uma hiperplasia bilateral de células secretoras de aldosterona.


Pacientes com características de hiperaldosteronismo primário, mas cuja cirurgia não detecta adenoma solitário, frequentemente apresentam hiperplasia nodular cortical, também chamada de hiperaldosteronismo idiopático e/ou hiperplasia nodular

Tabela de conteúdo

EPIDEMIOLOGIA

· Mulheres (duas vezes mais do que homens) · Faixa etária: 35-50 anos · 1% dos hipertensos · Prevalência pode atingir 5% de acordo com os critérios e a população estudada.

SINTOMATOLOGIA

A aldosterona aumenta a reabsorção de sódio e a secreção de potássio pelas células epiteliais tubulares renais, em especial nas células principais dos túbulos renais e, em menos quantidade, nos túbulos distais e ductos coletores. Assim, os efeitos do excesso de aldosterona estarão diretamente relacionados a altos índices de sódio e baixas quantidades de potássio e serão listados a seguir:

1. Aumento do volume do líquido extracelular e da pressão arterial, gerado pelo aumento da reabsorção de sódio, acompanhado de cefaléia. Apesar disso, alterações na concentração plasmática de sódio são pequenas, em virtude da simultânea absorção osmótica de água. Com base no nível e na duração da hipertensão, é freqüente a ocorrência de lesão estrutural da circulação cerebral, da vasculatura retiniana e do rim.

2. Fraqueza muscular e fadiga, resultantes do efeito da depleção de potássio sobre as membranas das células musculares, tanto pelo aumento da excreção desse íon, como pelo estímulo de seu transporte para o interior da maioria das células do organismo, o que gera um efeito depressor sobre a transmissão dos potenciais de ação pelas fibras nervosas.

3. Poliúria, resultante do comprometimento da capacidade de concentração de urina e, frequentemente, também relacionada à polidipsia (diabetes insipidos nefrogênico).

4. Alcalose leve, em virtude do aumento da secreção de íons hidrogênio em troca de sódio nas células intercaladas dos túbulos corticais.

5. Sinais eletrocardiográficos e radiográficos de aumento do ventrículo esquerdo. Embora sejam em parte secundários à hipertensão, a hipertrofia ventricular esquerda, além de desproporcional ao nível da pressão arterial quando comparada com a de indivíduos com hipertensão essencial, regride após a remoção de um aldosteronoma mesmo sem redução da pressão arterial.

6. Sinais eletrocardiográficos de depleção de potássio, como ondas U proeminentes, arritmias cardíacas e extra-sístoles.


No hiperaldosteronismo primário não há ocorrência de edema, em virtude do chamado “escape da aldosterona”: a hipertensão gerada pela retenção hidrossalina estimula a natriurese e diurese pressóricas e libera o hormônio natriurético atrial, aumentando a eliminação de sódio e água pelos rins e impedindo, portanto, a formação de edema

ACHADOS LABORATORIAIS

1. Hipocalemia: podem ocorrer níveis inferiores a 3mEq/L, embora no aldosteronismo primário, os níveis de potássio possam ser normais.

2. Alcalose metabólica e elevação do bicarbonato sérico: em virtude da perda de íons hidrogênio na urina e sua migração para o interior das células com depleção de potássio. Esses sintomas são perpetuados pela hipocalemia, que aumenta a capacidade do túbulo contorcido proximal em reabsorver bicarbonato. No caso de hipocalemia intensa, podem ocorrer, também, reduzidos níveis séricos de magnésio.

3. pH urinário neutro a alcalino: secreção excessiva de íons amônio e bicarbonato para compensar a alcalose metabólica.

DIAGNÓSTICO

	Os principais critérios diagnósticos de HAP são:

1. Hipertensão diastólica sem edema, em especial em pacientes que permanecem hipertensos mesmo com uso de 3 medicações anti-hipertensivas, incluindo um diurético.

2. Hipossecreção de renina, baseados em baixos níveis de atividade plasmática de renina, que não aumenta apropriadamente durante a depleção de volume (postura ereta, depleção de sódio). Renina plasmática estará baixa ou suprimida, inferior a 1 ng/ml/h.

3. Indivíduos com hipocalemia espontânea sem causa aparente ou induzida por diuréticos.

4. Hipersecreção de aldosterona, que não diminui apropriadamente em resposta à expansão do volume. Calcula-se a relação aldosterona plasmática/atividade de renina plasmática: valor entre 25-30 sugere aldosteronismo primário, enquanto valor maior ou igual a 50 praticamente fecha o diagnóstico, apesar de não indicar a causa. Valores plasmáticos de aldosterona maiores que 15ng/dl e níveis urinários maiores que 12 µg/24h também são um forte indício. No último caso, deve-se solicitar o sódio urinário para confirmação de adequado aporte.

5. Indivíduos com familiares de primeiro grau com evidência de hipertensão arterial ou acidente vascular cerebral antes dos 50 anos.

6. Indivíduos com incidentaloma adrenal.


Além dos exames para dosagem dos níveis de aldosterona e renina, quatro outros testes podem ser realizados:


· Teste de Infusão de volume (SF 0,9% 2 litros 4 em 4 horas): expansão do volume intravascular, realizando-se dosagens de aldosterona antes e depois da infusão. Em indivíduos normais, há uma queda na produção de aldosterona, já que a produção de renina é inibida pela expansão do volume. Em indivíduos com HAP, os valores plasmáticos de aldosterona praticamente não se alteram ou diminuem muito pouco. Esse teste é contra-indicado em pacientes com insuficiência cardíaca e hipertensão grave.

· Teste de supressão com captopril: é administrado ao paciente deitado 50mg de captopril e medidas a aldosterona e atividade de renina plasmática após duas horas. Se houver ausência da redução da aldosterona (< 10% do basal) ou aldosterona plasmática pós-teste > 5ng/dl, o teste será positivo.

· Teste com fludrocortisona: 0,1 mg de fludrocortisona, de 6/6h durante 4 dias, medindo-se a aldosterona plasmática basal após 4 dias. A ausência de supressão da aldosterona é caracterizada pelos mesmos parâmetros do teste com captopril.

· Teste da postura ereta: Coleta-se uma amostra de sangue para dosagem de renina em paciente deitado por no mínimo 40 minutos no laboratório e outra para dosagem após duas horas de caminhada. Em pacientes com adenoma (APA), não há elevação dos níveis de renina, pois o adenoma não responde ao aumento de angiotensina II produzido pela postura ereta. No caso de HAI, o aumento será de cerca de 3-4 vezes nos níveis de renina, em virtude da resposta à angiotensina II.

TRATAMENTO

O aldosteronismo primário causado por adenoma geralmente é tratado com excisão cirúrgica do adenoma, preferindo-se, quando possível, uma abordagem laparoscópica. Em muitos casos, a administração de um antagonista da aldosterona, como a espironolactona (25-100mg a cada 8 h para controle da hipertensão e da hipocalemia), e a restrição alimentar de sódio podem ser eficazes. A espironolactona, em homens, produz efeitos colaterais, como ginecomastia, diminuição da libido e impotência. Em caso de suspeita de hiperplasia bilateral idiopática, a cirurgia é apenas indicada quando a hipopotassemia sintomática significativa não pode ser controlada por terapia clínica (espironolactona, triantereno ou amilorida).



FONTES:

HARRISON – Medicina Interna 16ª edição: 2006

CECIL – Textbook of Medicine Goldman/Ausiello 22nd edition: 2004

GUYTON & HALL – Tratado de Fisiologia Médica 11ª edição: 2006.

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