Cardiopatias Congênitas - Parte I

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Cardiopatias Congênitas Parte I

Texto de Adriana Façanha

Cardiopatias Congenitas Cianóticas

TETRALOGIA DE FALLOT

TRANSPOSICAO DOS GRANDES VASOS


Epidemiologia

As cardiopatias mais comuns em crianças são aquelas de origem cardíaca. São as principais causas de óbito quando se consideram as malformações congênitas. São diagnosticadas, em sua maioria, na primeira semana de vida, quando não, no primeiro mês de vida da criança. No caso específico da Tetralogia de Fallot, sabe-se que ela é a mais comum entre as cardiopatias cianóticas.

Fisiopatologia

Para compreender bem como se processam essas doenças, precisamos ter em mente a idéia de que eles se manifestam, em sua maioria, na vida neonatal porque foram bem tolerados durante a vida intra-útero. O papel de trocas gasosas e metabólicas é feito, majoritariamente, pela placenta. Os vasos pulmonares do feto se encontram em estado de constrição intensa, recebendo cerca de 10% do débito cardíaco. O sangue fetal oxigenado na placenta vem pela veia umbilical, passa pelo ducto venoso e chega pela veia cava inferior ao átrio direito. Boa parte do sangue que chega nessa cavidade passa para o átrio esquerdo pela abertura chamada forame oval. O sangue que chega pela veia cava superior passa pela valva tricúspide até o ventrículo direito e é bombeado tanto para os pulmões como para a aorta descendente, pela estrutura ducto arterioso. Quando do nascimento, acontece grande expansão pulmonar, aumento da pressão parcial de oxigênio arterial e diminuição brusca da resistência ao fluxo sangüíneo pulmonar. Agora, a circulação do recém-nascido que passa pelo ventrículo direito vai, quase que integralmente, para os vasos pulmonares. A conseqüente maior chegada de sangue ao átrio esquerdo promove o fechamento do forame oval, primeiro fisiologicamente, depois anatomicamente, o que deve ocorrer até os 3 primeiros meses de vida. O ducto arterioso também se fecha, tornando-se um ligamento, por influencia das grandes pressões de oxigênio e pela diminuição dos níveis de prostaglandina E2. As cardiopatias congênitas cianóticas, em geral, refletem um desvio(shunt) no sentido direita-esquerda – sangue com baixas taxas de oxigênio chegando à circulação sistêmica sofrendo um desvio dos pulmões.

Etiologia

A causa desses defeitos é desconhecia, mas já existe documentação de defeitos cromossômicos associados a essas doenças. Por exemplo, no caso da Trissomia do 18 (S. de Edwards), onde 90% dos recém-nascidos possuem alguma cardiopatia congenita, 25% deles possuem a tetralogia de Fallot, abordada a seguir e também associada a síndrome do Álcool fetal.

Clínica

A clínica é, principalmente, a cianose, isto é, o aumento dos níveis de hemoglobina reduzida ou dessaturada de oxigênio no sangue arterial (níveis maiores que 5g de Hb reduzida/dL de sangue) torna azulada a coloração normalmente rosada das mucosas e da pele. A cianose pode ser central (acomete língua, face, lábios) ou periférica (acomete as extremidades). Com relação ao grupo de doenças que estudamos, ela tem um padrão misto. Ela traduz para o clínico alguma doença de origem cardíaca, pulmonar ou neurológica. O que, então, provoca a cianose nesses pacientes? A obstrução ao fluxo sangüíneo pulmonar ou a mistura de sangue oxigenado arterial com sangue venoso vindo da periferia. A perfusão pulmonar pode estar tão reduzida, que a única fonte de aporte sangüíneo pode vir a ser o ducto arterioso que sai da aorta descendente para o ramo da pulmonar. Por isso é tão importante a identificação rápida da natureza da cianose observada, a fim de estabelecer rapidamente, também, a conduta. Para testarmos se há obstrução ao fluxo sangüíneo pulmonar, podemos submeter o recém-nascido durante 5-10 min a oxigênio 100% e observar a resposta da Pao2. Se houver resposta significativa, podemos descartar cardiopatia congênita.


TETRALOGIA DE FALLOT

Ela resulta do desvio anterior do septo atrioventricular durante a embriogenese. São quatro os achados dessa síndrome: 1) ESTENOSE DA ARTÉRIA PULMONAR – acomete o infundíbulo e o anel valvar, ou seja, toda a saída do sangue do ventrículo direito. 2) COMUNICACAO INTERVENTRICULAR 3) DEXTROPOSICAO DA AORTA 4) HIPERTROFIA DO Ventrículo Direito.

Fisiopatologia

Podemos encontrar diversos graus de estenose da artéria pulmonar e de seus ramos, sendo a gravidade da doença tanto maior quanto maior for o grau de estenose. Se o grau de estenose for bem pequeno, podemos encontrar o paciente acianótico, em condição determinada Fallot acianótico, ou Fallot Rosa. O sangue pouco saturado de oxigênio chega ao átrio e ao ventrículo direitos e, bombeado pelo último, sofre desvio para o ventrículo esquerdo e aorta por meio da CIV, levando esse sangue para o corpo (cianose!). Concomitantemente, temos a estenose da artéria pulmonar (e seus ramos) e do anel valvar como fator agravante para a diminuição da oxigenação do sangue. Já foi dito anteriormente que a oxigenação do parênquima pulmonar pode ficar na dependência somente do ducto arterioso, mas também pode ser feito por colaterais. Dessa forma, a manifestação cardinal da cianose pode aparecer apenas diante do fechamento, já esperado, do ducto arterioso.

Clínica

Pode variar desde uma ICC direita (secundária a shunt esquerda-direita quando o grau de estenose pulmonar for pequeno), dispnéia de esforço, cianose (diversos graus), unhas em vidro de relógio (cianose prolongada) e baqueteamento digital. São possíveis complicações da doença: endocardite infecciosa, insuficiência cardíaca, trombose e abscessos cerebrais.

Diagnóstico

1) Radiológico : botão aórtico saliente, ponta cardíaca sobre o diafragma (sinal do tamanco holandês), sinais de hipoplasia pulmonar (vasos pouco desenvolvido, hilos pulmonares inexpressivos). 2) ECG : quando há hipertrofia do ventrículo direito,pode aparecer a onda T positiva em V1 com onda R aumentada nas precordiais. 3) ECO : diagnóstico dos defeitos valvares , avalia a CIV,diagnostica a posição errada da aorta e avalia o diâmetro das artérias pulmonares e seus ramos. 4) CATE: avalia a oxigenação e complementa o diagnóstico.

Tratamento

Clínico: - Aporte adequado de oxigênio -Uso de bicarbonato para corrigir a acidose metabólica. -Morfina -Aminas vasoativas (no intuito de aumentar a resistência periférica) -Betabloqueadores -Prostaglandina E1 em infusão contínua nos neonatos com indicação cirúrgica, a fim de manter patente o ducto arterioso. Cirúrgico - Correção paliativa de Blalock-Taussig (é instalado um desvio da estenose pulmonar entre a artéria pulmonar e a artéria subclávia). Indicada em crianças sem condições clínicas para a correção total. - Correção cirúrgica total – pode ser realizada entre 4 e 6 meses de vida.São corrigidos o CIV e a estenose pulmonar, desobstruindo a saída do sangue pelo ventrículo direito.

TRANSPOSICAO DOS GRANDES VASOS

O que acontece aqui é a localização anormal da aorta, anteriorizada em relação ao tronco da pulmonar. Além disso, a aorta sai do ventrículo direito e a artéria pulmonar sai do ventrículo esquerdo. O sangue dessaturado de oxigênio vindo da periferia chega ao átrio direito e é bombeado pelo ventrículo direito pela aorta de volta ao corpo – traduzindo a existência de duas circulações, a pulmonar e a sistêmica – em paralelo.

Fisiopatologia

Como foi colocado acima, caso não exista comunicação entre o sangue oxigenado nos pulmões e o sangue venoso bombeado continuamente pelo VD através da aorta, temos um quadro incompatível com a vida. O que permite a sobrevida desses recém-nascidos é a patencia do forame oval, do ducto arterioso e uma CIV associada em alguns casos, o que alivia a cianose. É mais comumente observado em recém-nascidos do sexo masculino (3:1) e em filhos de mães diabéticas.

Clínica

Cianose em graus variados, a depender da existência de estruturas que permitam a mistura desses sangues. Pode aparecer nas primeiras horas de vida quando não há CIV associado e pode piorar bastante diante do fechamento do forame oval na primeira semana de vida. A hipoxemia é grave e deve ser instituída terapia de urgência. O teste feito com oxigênio a 100% não observa qualquer melhora.

Diagnóstico

1) Radiológico: aparência da sombra cardíaca como um ovo deitado, aumento da trama vascular pulmonar. 2) ECG: só é útil quando há defeitos do septo interventricular associados, quando ele mostra ondas P proeminentes e sinais de hipertrofia de VD. 3) ECO: mostra as alterações da síndrome e aquelas associadas (CIV).

Tratamento

Clínico -Prostanglandina E1,na tentativa de manter pérvio o ducto arterioso e manter a mistura de sangue rico e pobre em oxigênio. -Aquecimento adequado do RN. Cirúrgico -Atrioseptostomia de Rashkind : comunicação entre átrio esquerdo e direito é realizada, tentando misturar sangue oxigenado e pouco oxigenado. -Inversao arterial ou cirurgia de Jatene – deve ser realizada nas primeiras duas semanas de vida da criança, para impedir a progressão de uma hipertrofia de VD e preservar a função de bomba maior de VE.

Bibliografia

Nelson Textbook of Pediatrics, 18ª edição, Kliegman, Behrman, Jenson, Stanton.

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