Texto de Everton Rodrigues
Manifestações Hematológicas da Infecção pelo HIV
Os pacientes infectados pelo HIV apresentam freqüentemente alterações hematológicas, especialmente as citopenias (anemia; leucopenia – em geral, neutropenia; trombocitopenia), as quais podem ser isoladas ou combinadas, e podem ter múltiplas etiologias.
As citopenias podem ser explicadas pelos seguintes mecanismos: ação direta do HIV (evidências demonstram que o vírus infecta as células progenitoras da medula óssea e as células-tronco hematopoiéticas) e de proteínas virais (gp 120, gp 160, tat, provocando diminuição da produção de unidades formadoras de colônias); ação de fatores imunes e de citocinas (TNF-α, INF-gama) sobre a medula óssea; efeitos colaterais de medicamentos (antirretrovirais, drogas utilizadas para tratamento das complicações infecciosas e neoplásicas da doença).
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É a citopenia mais freqüente (pode estar presente em até 90% dos pacientes HIV positivos), estando associada a uma maior taxa de mortalidade (independente da contagem de linfócitos T CD4+ e da carga viral) e maior risco de progressão para AIDS (principalmente com níveis de Hb < 8).
Geralmente, a anemia é multifatorial na infecção pelo HIV, incluindo causas como infecções oportunistas, drogas mielossupressivas, deficiências nutricionais e efeitos diretos do HIV sobre a medula óssea (células progenitoras e estromais).
Podemos dividir as causas da anemia em: causas que levam à diminuição da produção de hemácias/hemoglobina; causas que levam ao excesso da destruição de hemácias ou à perda de sangue; causas de hiperesplenismo.
• Anemia de doença crônica
• Drogas mielossupressoras
• Infiltração da medula (neoplasias, infecções)
• Deficiências (eritropoetina, ferro, folato, vitamina B12)
É uma anemia secundária a ativação imune, podendo ser causada por infecções crônicas, doenças auto-imunes, neoplasias. Ocorre a produção de citocinas inflamatórias (TNF-α, IL-1, IFN-gama), que atuam sobre o fígado estimulando a síntese de hepcidina, molécula que diminui a absorção intestinal de ferro e aumenta a captação e retenção de ferro no interior dos macrófagos (sistema reticuloendotelial), levando à hipoferremia (baixos níveis séricos de ferro). Além disso, as citocinas IL-1 e TNF-α inibem a produção de eritropoetina (EPO) e a responsividade dos precursores eritróides à eritropoetina (EPO).
A anemia de doença crônica deve ser tratada com altas doses de EPO, instituição de HAART (terapia antirretroviral de alta eficácia) e correção das deficiências vitamínicas.
Certas drogas atuam sobre a medula óssea, causando mielossupressão. As principais são: zidovudina (AZT) – causa anemia macrocítica dose-dependente; sulfametoxazol-trimetropim; anfotericina B; ganciclovir; dapsona.
A diminuição da produção de hemácias/hemoglobina pode ser causada pela infiltração da medula óssea por agentes infecciosos ou neoplasias. Entre os microrganismos que causam mais comumente essa infiltração, podemos citar: Leishmania chagasi (Calazar), Histoplasma capsulatum (histoplasmose disseminada), Mycobacterium tuberculosis (tuberculose disseminada), Mycobacterium avium (MAC), Parvovírus B19 (causa aplasia pura da série vermelha através da ligação do vírus ao antígeno P do grupo sanguíneo; devido ao estado de imunodepressão, o indivíduo não produz anticorpos neutralizantes do parvovírus, ocorrendo então uma intensa replicação viral no interior dos precursores eritróides, o que leva a uma anemia profunda e crônica). A principal neoplasia em pacientes infectados pelo HIV que infiltra a medula é o linfoma não-Hodgkin.
• Hemólise (PTT, anemia hemolítica auto-imune)
• Drogas (ceftriaxone, indinavir): induzem hemólise por alguns mecanismo, como o da imunidade cruzada (anticorpos produzidos contra as drogas acabam se ligando às hemácias, por similaridade de certas regiões entre as moléculas, levando à anemia hemolítica)
• Infecção (CMV)
• Hemorragia do TGI (linfoma não-Hogkin; sarcoma de Kaposi no TGI; infecção, p.ex. CMV)
É uma entidade clínica causada pela deficiência quantitativa ou qualitativa da protease que cliva os multímeros do fator de Von Willebrand (a ADAMTS13). Como conseqüência, ocorre oclusão difusa de arteríolas e capilares da microcirculação. O HIV contribui para que ocorra PTT tanto pela disfunção imune (produção de anticorpos anti-ADAMTS13), como pela infecção direta das células endoteliais, gerando disfunção endotelial (com liberação desordenada do fator de Von Willebrand).
A PTT ocorria em 1,4% dos pacintes com AIDS na era pré-HAART (é, portanto, de ocorrência rara). Quadro clínico (péntade): anemia hemolítica microangiopática + plaquetopenia + insuficiência renal + febre + sinais neurológicos.
O tratamento é feito com plasmaférese.
• Infecção
• Linfoma não-Hodgkin
• Cirrose hepática
Neutropenia leve é relativamente freqüente em pacientes HV positivos e, em geral, com pouco significado clínico. Aqui também podemos dividir as causas em: causas que levam à diminuição da produção (granulopoese); causas que levam ao aumento da destruição ou perda; causas de hiperesplenismo.
• Drogas (AZT, ganciclovir, sulfametoxazol-trimetropim, anfotericina B, ritonavir, quimioterápicos)
• Deficiências (folato, vitamina B 12)
• Infecções (HIV, micobacterioses, histoplasma)
• Neoplasias
• Neutropenia auto-imune
• Infecção
• Linfoma não-Hodgkin
• Cirrose hepática
É um achado bastante comum em pacientes com HIV. Ocorre em pacientes assintomáticos e pode ser o primeiro sinal de infecção pelo HIV. 1/3 dos pacientes podem cursar com petéquias e equimoses. Em geral, é leve a moderada (40.000/mm³ a 60.000/mm³).
• Drogas (sulfametoxazol-trimetropim, pirimetamina, ritonavir, ganciclovir, anfotericina)
• Deficiências (folato, vitamina B 12)
• Infecções
• Neoplasias
• PTI (Púpura trombocitopênica imune)
• PTT (púrpura trombocitopênica trombótica)
• Drogas (saquinavir, interferon)