Síndrome de Behçet

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Edição de 00h48min de 5 de Outubro de 2011

Texto de Viviane Teixeira


SÍNDROME DE BEHÇET



A Síndrome ou Doença de Behçet é uma desordem caracterizada por úlceras orais, além de sintomas sistêmicos, como úlceras genitais, doença ocular, lesões cutâneas, envolvimento gastrointestinal, doença neurológica, vascular ou artrite.

Acredita-se que são decorrentes de vasculites e, dentre as vasculites sistêmicas, Behçet é caracterizada por abranger vasos de todos os calibres em sítio tanto arterial quanto venoso da circulação.

Embora algumas manifestações sejam características, não há alterações laboratoriais ou histopatológicas definitivas da doença, o que torna seu diagnóstico veementemente clínico e baseado nos seguintes critérios:

Tabela de conteúdo

Critérios Diagnósticos

Ulceração oral recorrente mais dois dos seguintes:

- Ulceração genital recorrente - Lesões oculares - Lesões cutâneas - Teste de patergia (explicado posteriormente)

EPIDEMIOLOGIA

Acomete com igual freqüência jovens de ambos os sexos das regiões do Mediterrâneo, Oriente Médio e Extremo Oriente (sugerindo ligação com a antiga Rota da seda; afro-descendentes raramente são afetados), embora a sintomatologia seja em geral mais grave no sexo masculino.

PATOGENIA

A etiologia e patogenia dessa afecção permanecem ainda pouco elucidadas, apesar de pesquisas indicarem o envolvimento do TNF. Como principal lesão patológica temos uma perivasculite sistêmica com infiltração precoce de neutrófilos, tumefação endotelial e necrose fibrinóide. Há ainda infiltração por número aumentado de células Tγδ, e nos estágios mais avançados da doença podemos encontrar ainda auto-anticorpos circulantes contra α-enolase de células endoteliais e anticorpos anti-Saccharomyces cerevisae (ASCA – característicos da doença de Chron).

Na Doença de Behçet, temos uma tendência aumentada à formação de trombos, provavelmente ou a fatores trombofílicos adicionais ou à vasculite inflamatória por si só. Temos ainda uma forte associação com o aloantígeno HLA-B5.

Resumindo, nessa afecção temos em geral:

- Influências genéticas incluindo associação com HLA

- Antígenos bacterianos com reação cruzada para peptídeos humanos

- Populações alteradas de células hematopoiéticas e citocinas associadas

- Presença de complexos imunes e auto-anticorpos

- Ativação vascular endotelial e hipercoagulabilidade

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

As manifestações clínicas mais comuns são úlceras mucocutâneas recorrentes e, em geral, dolorosas.


Ulcerações aftosas

Consideradas sine qua non para o diagnóstico, frequentemente rasas ou profundas, com base necrótica central amarelada. Por serem caracteristicamente dolorosas, podem dificultar a alimentação. Ocorrem isoladas ou em grupos em qualquer parte da cavidade oral. Variam de poucos milímetros a 2 centímetros e têm duração de 1-2 semanas, regridindo sem deixar cicatrizes.

Ulceração oral recorrente 3 vezes em um ano é critério necessário para estabelecimento de diagnóstico para Behçet.

Úlceras genitais

De acordo com o Harrison, são menos comuns, porém mais específicas. O uptodate informa que as lesões podem estar presentes em cerca de 75% dos pacientes ou mais. São geralmente encontradas em região escrotal em homens e vulvar em mulheres, não afetando a glande ou a uretra. Produzem cicatrizes escrotais.

Lesões cutâneas

Ocorrem em mais de 75% dos pacientes com Behçet e incluem foliculite, eritema nodoso, exantema semelhante à acne e, pouco frequentemente, vasculite. Reatividade inflamatória inespecífica a algum arranhão, ou injeção intradérmica de solução salina (Teste de patergia) é uma manifestação comum e específica.

Manifestações oculares

Ocorrem em 25-75% dos pacientes, de acordo com a população estudada. O envolvimento ocular com cicatrizes e panuveíte bilateral é uma complicação bastante temida, pela ocasional progressão rápida à cegueira, e à qual é atribuído o maior grau de morbidade e mortalidade, juntamente com a doença vascular e de SNC. Costumam estar presentes no início, porém pode se desenvolver ao longo dos anos. Pode ocorrer sob as formas de: irite, uveíte posterior, oclusões de vasos da retina e neurite óptica, além da uveíte de hipópio que, embora rara, é característica da doença (camada de pus visível na câmara anterior, indicando, em geral, doença grave vascular na retina).

Artrite

Geralmente é assimétrica, não-erosiva e não-deformante, ocorrendo em cerca de metade dos pacientes. Acomete médias e grandes articulações, como de joelhos, tornozelos e punhos.

Trombose

Ocorre em 25% dos pacientes em veias periféricas superficiais e profundas, sendo rara a embolia pulmonar. Ocasionalmente, pode haver acometimento de veia cava superior. O comprometimento arterial é incomum e ocorre como inflamação da aorta ou aneurisma arterial periférico e trombose arterial.

Neurológico

Ocorre em 5-10% dos pacientes, em especial na forma parenquimatosa (80%). Está associado ao envolvimento do tronco encefálico e apresenta prognóstico sombrio. Em caso de suspeita de acometimento neurológico, devem ser realizados RM e espectroscopia de prótons por ressonância magnética (ERM), métodos bastante sensíveis.

Gastrointestinal

Presença de ulcerações mucosas do intestino, semelhantes à Doença de Chron.

LABORATÓRIO

Envolve principalmente indicadores inespecíficos de inflamação, como leucocitose e hemossedimentação elevada, assim como níveis altos de proteína C reativa. Podem ser encontrados, ainda, auto-anticorpos.

PROGNÓSTICO E CONDUTA

Em geral, a gravidade diminui com o tempo, sendo a expectativa de vida normal, a não ser em pacientes com síndrome de neuro-Behçet e doença de grandes vasos. A única complicação séria é a cegueira.

Pode-se utilizar glicocorticóides para o acometimento de membranas mucosas, ou, em casos mais sérios, a talidomida (100 mg/dia).

Tromboflebite: ácido acetilsalicílico 325 mg/dia.

Manifestações cutâneas: colchicina pode ser benéfica.

Uveíte e síndrome de neuro-Behçet: terapia sistêmica com glicocorticóide (predinisona 1 mg/kg/dia) e azatioprina, 2 a 3 mg/kg/dia. Interferona também é bastante eficaz em ambos os casos, inclusive uveíte refratária.

O início precoce da azatioprina tende a favorecer o prognóstico a longo prazo da síndrome de Behçet.


BIBLIOGRAFIA:

Harrison Medicina Interna - 17a edição

UpToDate

Revista Brasileira de Reumatologia - Atualização em Doença de Behçet

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