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São admitidos basicamente critérios clínicos para a cura da Leishmaniose visceral, a saber: | São admitidos basicamente critérios clínicos para a cura da Leishmaniose visceral, a saber: | ||
• Desaparecimento da febre: geralmente a partir do 5º dia de medicação | • Desaparecimento da febre: geralmente a partir do 5º dia de medicação | ||
- | • Melhora do hemograma: a partir da 2ª semana | + | • Melhora do hemograma: a partir da 2ª semana |
• Redução da hepatoespleno: primeiras semanas | • Redução da hepatoespleno: primeiras semanas | ||
• Eletroforese de proteínas: se normaliza depois de meses | • Eletroforese de proteínas: se normaliza depois de meses |
Texto de Thyago Araújo
Calazar - Atualização
A Leishmaniose Visceral constitui infecção por protozoário do complexo Leishmania donovani. Segundo a OMS, representa uma das seis endemias de maior destaque em nível global. Dos doze países atingidos na América Latina, 90% da casuística provém do Brasil, sobretudo da região Nordeste.
Tabela de conteúdo |
A Leishmaniose Visceral, também conhecida popularmente como calazar ou barriga d’água, trata-se da infecção por protozoário do complexo Leishmania donovani, que compreende a L. chagasi (América), a L. donovani (Índia, China, Iraque e Leste da África) e a L. infantum (Norte da África e Europa Mediterrânea).
Historicamente era uma doença restrita a animais, porém com o avanço da urbanização, o homem passou a assumir a condição de hospedeiro da Leishmania, tornando o calazar uma antropozoonose.
Segundo a OMS, constitui uma das seis endemias de maior destaque em nível mundial. Dos doze países atingidos na América Latina, 90% da casuística provém do Brasil, sobretudo da região Nordeste. O primeiro registro da doença no país data de 1913, quando da realização da necropsia no Paraguai de um paciente com esplenomegalia febril proveniente de Minas Gerais.
De 1984-2002, aproximam-se de 50 mil os casos da doença notificados no Brasil, sendo 66% deles proveniente de estados como Bahia, Ceará, Maranhão e Piauí. A doença acomete principalmente crianças menores de 10 anos (54,4% dos casos), deste total 41,0% se concentram na população pediátrica menor que 5 anos, em decorrência de fatores como a imaturidade imunológica celular e a forte associação com a desnutrição nessa faixa etária.
Estudos demonstram também que pertencem ao sexo masculino a maioria dos casos (60%), muito embora não se encontrem justificativas para esse acometimento preferencial. Não existe diferença em casuística entre raças.
De modo geral, ambientes de aspectos geográficos, climáticos e sociais diferenciados tem sido palco do adoecer pelo calazar. Com o tempo, tem-se visto uma transição epidemiológica da doença: anteriormente restrita a regiões rurais (pouco urbanizadas); porém agora em avanço a ambientes peri-urbanos e urbanos de grandes metrópoles.
A etiologia da doença compreende, conforme dito, protozoários do gênero Leishmania, parasita intracelular obrigatório do sistema fagocítico mononuclear, também chamado retículo-endotelial. O agente apresenta duas formas morfológicas distintas: a flagelada (promastigota), encontrada no tubo digestivo dos insetos vetores e a aflagelada (amastigota), presente no tecido dos vertebrados infectados.
Há tanto reservatório urbanos (cão) quanto silvestres (raposas, gambás), podendo-se dizer que existe uma enzootia, isto é, uma endemia entre animais. Os vetores envolvidos com a transmissão da doença são o Lutzomya longipalpis e o Lutzomya cruzy.
Esses insetos possuem hábito herbívoro, no entanto a fêmea apresenta também atividade hematófaga, utilizando o sangue para a postura dos ovos e perpetuação da espécie. No período de chuvas, há um boom populacional de vetores, aumentando a freqüência do ataque a humanos principalmente ao anoitecer e, conseqüentemente, fazendo crescer o número de indivíduos doentes.
Ao picar o animal infectado, o vetor adquire formas amastigotas do protozoário, as quais se chegam ao interior do seu tubo digestivo com a eclosão dos monócitos adquiridos a partir do repasto sanguíneo. Nessa topografia, a leishmania aflagelada torna-se flagelada e migra para as glândulas salivares do inseto. Com isso, ela se deposita na derme do homem, sendo englobada por macrófagos. Incapazes de fagocitar o parasito por completo, os macrófagos rompem com a divisão binária repetitiva da leishmania, já transformada novamente em aflagelada. Com isso ocorre parasitemia, entrada em monócitos no sangeu e disseminação para órgãos do sistema fagocítico mononuclear: linfonodos, fígado, baço e medula óssea.
No que diz respeito à susceptibilidade diferencial entre as pessoas, sabe-se que os extremos de idade são mais vulneráveis à infecção-doença. Nele, o braço celular de resposta imune pouco se expressa; enquanto que o humoral revela-se ineficaz para conter o avanço da parasitemia.
O espectro clínico da apresentação da infecção pelo complexo leishmania é bem amplo, podendo ser oligo-assintomático (maioria), moderado e grave.
A infecção, quando inaparente, não requer tratamento ou notificação; o seu diagnóstico se dá por sorologia (Imunofluorescência indireta/Elisa) ou mesmo por reação de Montenegro ( + ).
A infecção-doença, em contrapartida, é marcada por uma esplenomegalia febril com ou sem hepatomegalia, podendo sua evolução ser didaticamente dividida em período inicial, de estado e final.
Nos animais susceptíveis, a apresentação clínica é caracteristicamente insidiosa, envolvendo onicogrifose, esplenomegalia, linfadenopatia, coriza, cerato-conjutivite, alopecia/dermatites, apatia, edema de patas, diarréia e/ou hemorragia intestinal. A confirmação laboratorial sorológica se dá através do Elisa ou da Imunofluorescência indireta.
o forma AGUDA, variável; o febre < 3 semanas, palidez, hepatoespleno, baço 5cm abaixo RCE, estado geral do paciente é preservado; o Anemia com Hb> 9, leucócitos e plaquetas nl, VHS elevado (>50mm) e as proteínas totais e frações podem estar discretamente alteradas; o IFI e ELISA (+) e Montenegro (-). O aspirado de MOV/baço: formas amastigotas do parasita.
o Quadro clínico arrastado > 2 meses; o Febre irregular, emagrecimento, palidez e aumento das VMGs, estado geral do paciente já mostra certo nível de comprometimento; o Pancito, inversão alb/glob, aumento TGO/TGP (2-3X nl), bilirrubinas, aumento discreto de Ur e Cr; o Anticorpos anti-Leishmania, Montenegro (-). Parasita em aspirado de medula óssea, baço, fígado e linfonodos;
o Sem DX e tto, doença evolui, febre contínua e EGC; desnutrição (cabelos quebradiços, cílios alongados e pele seca), edema dos membros inferiores - anasarca. o Outras manifestações: hemorragias (epistaxe, gengivorragia e petéquias), icterícia e ascite. o ÓBITO: infecções bacterianas e/ou sangramentos
O diagnóstico diferencial é feito basicamente com as seguintes condições clínicas:
No atendimento de pacientes com suspeita/confirmação de Leishmaniose visceral, devem ser observados alguns fatores que falam a favor de um pior prognóstico – maior morbimortalidade, complicações mais freqüentes, maior tempo de internação hospitalar, etc. São eles: • Idade < a 6 meses ou > a 65 anos • Desnutrição grave WikiPETia Médica • Co-morbidades, infecção bacteriana secundária inclusive (ex. PAC, ITU, etc) • Uma das seguintes manifestações clínicas: o icterícia o fenômenos hemorrágicos (exceto epistaxe) o edema generalizado o sinais de toxemia (letargia, má perfusão, cianose, taquicardia ou bradicardia, hipoventilação ou hiperventilação e instabilidade hemodinâmica).
Mesmo não preenchendo fatores de gravidade, pacientes que apresentem sinais de alerta também são merecedores de atenção especial por parte dos profissionais de saúde.
Compreendem esse grupo indícios, sugestivos de gravidade potencial, alguns como: • Crianças: idade entre 6 meses e 1 ano • Adultos com idade entre 50 e 65 anos • Recidiva • Diarréia, vômitos • Infecção bacteriana suspeita • Febre há mais de 60 dias
Como métodos complementares de diagnóstico específico, conta-se com os imunológico e o parasitológico. Em associação com clínica e outros dados laboratoriais, o teste sorológico reagente reforça o diagnóstico de Leishmaniose visceral. Os mais utilizados são o IFI (a partir de 1:80) e os ensaios imunoenzimáticos (K-39). Sensibilidade da sorologia: 90-100% nos imunocompetentes e 50-60% nos imunodeprimidos.
Mesmo na presença de sorologia reagente, convém fazer uso de métodos de diagnóstico parasitológicos para evitar os falsos-positivos da imunologia, bem como para se contar com um parâmetro de controle pré e pós tratamento, muito embora não se indique mais a repetição de métodos invasivos enquanto critério de cura.
A punção aspirativa esplênica constitui o método de maior sensibilidade (90-95%), não sendo realizada rotineiramente em decorrência de restrições ao procedimento, como o risco maior de sangramentos, rotura esplênica, etc. O aspirado de MOV, biópsia hepática e a aspiração de linfonodos apresentam menor sensibilidade. O material coletado pode ser submetido ao exame direto – imprint, Giemsa ou Wright, Leishman, Panóptico – ou cultura, meio NNN. Historicamente, relata-se um método de análise que consistia na inoculação em hamsters, hoje em dia sem utilidade. O PCR, identificação do DNA da leishmania no material colhido, representa o método de maior acurácia disponível, possui sensibilidade e especificidade próximas de 100%. A limitação ao seu emprego rotineiro encontra-se no alto custo.
Além dos exames complementares específicos para auxílio no diagnóstico, convém a solicitação de outros, a exemplo de hemograma completo, VHS, TAP/TTPA, creatinina sérica, transaminases, eletrólitos, albumina, globulina, hemocultura, urocultura, sumário de urina e Raio X de tórax.
A hospitalização está indicada para pacientes que apresentem pelo menos um sinal de gravidade ou alarme; bem como para aqueles que exibam alguma das alterações laboratoriais a seguir: • leucócitos < 1.000/mL ou neutróflos < 500/mm3 • plaquetas < 50.000/mL • HB < 7g/dL • Cr 2x> VR • TAP < 70% • Bil> VR • TGO/TGP 5x> VR • Albumina < 2,5mg/mL • RX de tórax: infecção ou edema pulmonar
A estratégia terapêutica perpassa tanto tratamento de suporte (dieta hiperprotéica/hipercalórica, hidratação, hemodiálise*, antibioticoterapia, antibioticoprofilaxia, hemotransfusões, uso de fatores estimuladores de colônia de granulócitos/monócitos, ventilação mecânica*, sedação/analgesia*, drogas vasoativas*, reposição eletrolítica), quanto o tratamento específico com drogas anti-leishmania.
A droga de primeira escolha na maioria dos casos para o tratamento específico são os antimoniais pentavalentes, como o Stibogluconato de sódio e o Antimoniato-N-metil glucamina. Recomenda-se dose de 20mg de Sb+5 kg/dia, EV ou IM por 20-40 dias. Como paraefeitos, podem desencadear distúrbios de repolarização (inversão e achatamento da onda T e aumento do intervalo QTC). Após o 20º dia de tratamento, ECG semanal/ausculta cardíaca cuidadosa. Se arritmia, suspender e usar droga alternativa.
Constituem contra-indicações formais ao uso do antimoniais as seguintes situações: • uso de beta-bloqueadores e antiarrítmicos • insuficiência renal ou hepática • grávidas nos dois primeiros trimestres • ECG com intervalo QTC superior a 400ms (homens) e 450 ms (mulheres)
Diante de gestação, contra-indicação, toxicidade ou refratariedade aos antimoniais, recomenda-se o uso de Anfotericin B, dose 1mg/kg/dia, máximo de 50mg/dia, diluídos na proporção 1mg/10mL de SG 5%, correndo de 4-6h. Pode haver efeitos colaterais dose-dependentes: alterações pulmonares / renais; flebite, cefaléia, febre, calafrios, astenia, dores musculares e articulares, vômitos e hipotensão, sobrecarga hídrica, hipocalemia.
São admitidos basicamente critérios clínicos para a cura da Leishmaniose visceral, a saber: • Desaparecimento da febre: geralmente a partir do 5º dia de medicação • Melhora do hemograma: a partir da 2ª semana • Redução da hepatoespleno: primeiras semanas • Eletroforese de proteínas: se normaliza depois de meses
OBS1.: Recomenda-se acompanhamento ambulatorial com 3/6/12 meses após a alta; a sorologia se negativa tardiamente.
OBS2.: Se melhora persistente, o controle através de novo parasitológico se torna dispensável.
Bibliografia
Leishmaniose visceral grave – normas e condutas; Ministério da Saúde, 2006.